A Joaquim Cartaxo
Ninguém deu fé quando aquele homem alto e magro, nu da cintura para cima e usando bermuda jeans rasgada, postou-se silenciosamente diante de um amplo muro na Avenida da Universidade, em plena quentura do meio-dia. Os passantes, tentando fugir da canícula, sequer desconfiavam da gana de saber gravada nos olhos daquele sujeito, fixos naquele extenso paramento. A chave para a compreensão de uma trajetória histórica, em toda a sua complexidade, pensava, repousava no cerne daquela muralha. Tarefa digna de um louco, alguém poderia pensar; para ele, algo mais que necessário, que precisava ser feito a todo custo, um imperioso alumbramento. Tendo o sol por principal testemunha, tirou uma espátula do bolso e atacou o grosso reboco do paredão.
Escolheu como alvo predileto de sua inquietação justamente o ponto da áspera superfície onde foram colados panfletos de propaganda de dois candidatos a governador. A mão desarmada ajudava a que portava a ferramenta, num mister obstinado de descoberta. Logo o desbaste alcançava uma área maior, revelando aos poucos os dizeres de uma campanha política de passado recente, na qual os atuais litigantes eram parceiros e andavam lado a lado. A lida calada e persistente do arqueólogo improvisado, seus dedos e palmas sujos de caliça, começou a despertar o interesse dos transeuntes daquela via, tão conhecida por suas bandeiras e passeatas vermelhas. Um grupo passou a apreciar seus ágeis movimentos; num instante, tinha muita gente aos seus pés.
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