“Onde
se abrigam os animais domésticos? Gosta de árvores, frutas? Sabe fazer panelas
de barro? Colcha de retalhos, chapéu de palha, rendas? Onde come? Tem flor,
pássaros, vasos nas casas?”. Nas perguntas do roteiro de pesquisa de campo
elaborado por Lina Bo Bardi, em 1975, para o projeto da Comunidade Cooperativa
de Camurupim, em Propriá, Sergipe, ganham luzes os processos mais lentos da
vida, as tessituras das coisas do cotidiano, os modos das pessoas organizarem o
espaço doméstico, de conceberem os utensílios da vida. “Este carinhoso amor
pelos objetos de todos os dias (...) é uma necessidade vital que se acha nos
primórdios da vida humana", lembra a arquiteta.
Nessa
abordagem de Lina, tão profunda, cuidadosa, feminina, ressurge a aldeã dos
tempos primevos, como a concebeu Lewis Mumford, no clássico "A Cidade na
História" : era a mulher que manejava o bastão de cavar, cuidava dos
jardins, descobriu as espécies comestíveis. Foi a mulher que fabricou os
primeiros recipientes – cestos, jarros,
tinas, potes, depósitos. E celeiros. E
casas. "Segurança, receptividade, proteção e nutrição –
tais funções pertencem à mulher (...) A casa e a aldeia, e com o tempo a
própria cidade, são obras da mulher".
No mês em que se celebra o dia da mulher, evidenciando
conquistas e tantos desafios a enfrentar, as palavras do grande sociólogo americano e,
de forma muito especial, da arquiteta Lina Bo Bardi – neste ano que marca os setenta anos em que deixou a
Itália e chegou ao Brasil, seu novo torrão querido – nos lembram as grandes
responsabilidades do nosso belo ofício de arquitetar, em um mundo que solapa os
valores mais fundamentais da vida, que nós, mulheres, tão bem conhecemos.
Arquiteta Solange Schramm
Conselheira Fiscal do IAB-CE 2017-2019
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