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segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Planeta cidade

A enorme demanda por moradia impõe desafios na mesma proporção. Mais moradias implicam maior consumo de recursos

Fábio Angeoletto*

O Brasil experimenta um novo ciclo de urbanização. De acordo com o IBGE, desde os anos 90 nossas cidades médias (aquelas com populações entre 100 mil e 500 mil habitantes) estão crescendo mais rapidamente do que as pequenas e grandes urbes.

Em paralelo, há uma tendência mundial de um aumento maior do número de residências, em relação ao número de moradores das cidades. Em Maringá, no Paraná, por exemplo, na última década, o número de residências cresceu 38,68%, enquanto que a população aumentou em 23,7%. Isso ocorre porque, embora o número médio de pessoas por família tenha diminuído no Brasil, a população segue crescendo. Famílias menores, porém mais numerosas, demandam a construção de mais residências.

Biólogos norte-americanos estimaram que 233 milhões de residências serão construídas em áreas de grande biodiversidade, para acomodar os núcleos familiares que estão se formando. Mais da metade da população mundial vive em cidades, percentual que aumentará nos próximos anos.

A enorme demanda por moradia impõe às municipalidades desafios na mesma proporção. Mais moradias redundam em maior consumo de recursos, e na conversão de bosques e áreas agrícolas em cidades.

Estudamos detalhadamente essas tendências de expansão urbana, e escrevemos a tese de doutorado Planeta Cidade: Ecologia Urbana e Planificação de Cidades Médias do Brasil. A tese foi defendida recentemente, na Universidade Autônoma de Madri, e contém uma série de diretrizes de planejamento com o duplo objetivo de colaborar para o aumento da qualidade de vida, em paralelo à diminuição de impactos ambientais resultantes da urbanização.

As cidades brasileiras predominantemente horizontais, como é o caso das cidades médias, possuem um recurso extraordinário, cujo potencial não é aproveitado. Os quintais urbanos, em conjunto, detêm centenas de hectares de solo que pode ser usado para o cultivo de alimentos, para a conservação da flora (não é incomum encontrar nesses espaços, espécies vegetais ameaçadas de extinção) e para a atração de populações de animais com funções ecológicas importantes, como a polinização.

Estudos da FAO demonstram que cultivos nos quintais podem alimentar as famílias, ao longo do ano, com frutas e hortaliças. Nós vivemos no Brasil o que definimos como a “tragédia da segurança alimentar”: de acordo com o IBGE, mais de 90% da população com 10 anos de idade ou mais não ingere a porção diária de frutas e verduras recomendada pela OMS.

Por outro lado, existe uma correlação entre cultivos em quintais e consumo: as famílias que plantam incorporam esses alimentos à dieta. Evidentemente, o incremento da área cultivada nos quintais só acontecerá com um aporte incisivo de incentivos diversos, que abrangem educação nutricional e suporte agronômico.

É fundamental o estabelecimento de legislação que garanta uma área mínima não pavimentada nos quintais, que, de acordo com nossos estudos, não deverá ser menor do que 100 metros quadrados.

E o planejamento deve se estender às residências. Os municípios precisam oferecer aos cidadãos apoio técnico para a construção de moradias verticalizadas, de modo que a edificação ocupe uma área menor no lote. Ademais, é preciso desenhar vivendas que aproveitem melhor a luz solar e que captem a água das chuvas para os cultivos domésticos.

Plantar nos quintais significa diminuir os impactos derivados da agricultura industrial, como a morte de milhões de animais envenenados pelo uso de pesticidas. Mas os benefícios são mais amplos.

No Reino Unido, a jardinagem é considerada uma estratégia para a promoção da saúde mental: cultivar é relaxante. No Brasil, sequer conhecemos a área média dos quintais de nossas cidades, o que inviabiliza sua planificação.

As famílias florescem e o concreto avança, materializando o sonho e o direito à moradia. Mas um teto, apenas, é muito pouco para uma família, e um ônus severo ao ambiente, se continuarmos a repetir as velhas fórmulas de um urbanismo obtuso. O momento pede criatividade e ação.

*Fabio Angeoletto é doutor em ecologia, pela Universidade Autônoma de Madri, e professor do Mestrado Profissional em Políticas Públicas da Universidade Estadual de Maringá (PR).


Fonte: O Povo

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