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terça-feira, 24 de março de 2015

"As redes cicloviárias só atingirão densidade e qualidade quando a bicicleta for considerada um modal de transporte", diz Isabela Ledo




Um trabalho de conclusão de curso com a proposta de uma rota cicloviária da Tijuca ao Fundão, "Vou de bicicleta", deu a Isabela Ledo o prêmio Arquiteto do Amanhã de 2008. Sete anos depois, o tema - que surgiu na vida da arquiteta quando ela foi fazer intercâmbio acadêmico entre Berlim e Amsterdã - continua pautando sua carreira.

Fez mestrado na Holanda, onde chegou a trabalhar na Dutch Cycling Embassy (Embaixada Holandesa de Ciclismo), uma organização público-privada especializada em serviços relacionados à bicicleta, e desde janeiro coordena o Programa Niterói de Bicicleta, que pretende implantar 120 quilômetros de ciclovias na cidade até 2033.

Conversamos com Isabela sobre o ciclismo urbano no Brasil.


IAB: Em Amsterdã, andar de bicicleta é algo natural. No Brasil, os ciclistas ainda sofrem com a cultura rodoviária. O ciclismo urbano pode ser algo natural em qualquer cidade do mundo ou há cidades que não foram feitas para as bicicletas?

Existem diversos fatores que condicionam o uso da bicicleta em uma cidade, entre eles a topografia, o clima, a segurança e a cultura locais, além da organização do seu espaço físico. Nessa lógica, as cidades "cicláveis" ideais são aquelas planas, com clima temperado, ruas ordenadas e seguras e com uma configuração espacial compacta e multifuncional. É o caso de Amsterdã, por exemplo. No entanto, isto não significa que outras cidades não possam se adaptar a estas condições. Salvo a questão topográfica, um pouco mais complicada de se resolver, todos os possíveis problemas gerados pelos outros fatores podem ser minimizados através da construção de uma infraestrutura adequada, de uma política massiva de incentivo a esse modal e de um planejamento urbano voltado para as pessoas. No Brasil, o clima tropical é considerado um grande impeditivo para as pessoas que querem ir de bicicleta ao trabalho, um problema que pode ser  minimizado com a construção de vestiários com chuveiros em edifícios comerciais e em outros locais estratégicos.

IAB: Como é o trabalho da Dutch Cycling Embassy?

A Dutch Cycling Embassy (DCE) surgiu da crescente demanda por parte de diversas cidades do mundo, interessadas em incorporar a expertise da Holanda em suas políticas cicloviárias. De caráter público-privado, a organização é composta por diversas municipalidades e empresas particulares especializadas nos mais diversos serviços relacionados ao tema, desde projetos de infraestrutura (ciclovias, bicicletários, etc.) e de educação e incentivo ao uso da bicicleta, até produtos bem específicos como, por exemplo, bicicletas elétricas feitas de madeira. No processo de transferência deste conhecimento, a DCE busca então adaptar as soluções e melhores práticas holandesas à realidade local dos seus parceiros.

IAB: Qual o objetivo do Programa Niterói de Bicicleta, que você está coordenando?

O Niterói de Bicicleta faz parte de um projeto muito maior que é o Plano Estratégico 'Niterói que Queremos', desenvolvido na atual gestão municipal para os próximos 20 anos (2013-2033). O programa foi pensado como uma resposta aos desafios relacionados à mobilidade, ao meio ambiente e, de uma maneira mais ampla, à qualidade do espaço urbano de Niterói. Com metas a curto, médio e longo prazos, é responsável pelo planejamento da malha cicloviária da cidade - que até 2033 deverá somar 120 quilômetros; pela implementação de outros elementos de apoio, como bicicletários e paraciclos; e por diversos projetos de incentivo ao uso da bicicleta, tais como campanhas educativas e eventos cuja temática é a mobilidade sustentável, principalmente a não motorizada.

IAB: Que cidade brasileira está melhor no quesito ciclovias hoje? E o que falta para que essas redes sejam ampliadas?

Eu voltei há muito pouco tempo da Holanda, onde morei por seis anos, e nesse período curto pedalei pelo Rio, por São Paulo e por Niterói. Fiquei bastante impressionada com a infraestrutura que está sendo construída na capital paulista. Além da meta ambiciosa de se completar 400 quilômetros de ciclovia ainda este ano (hoje, a cidade conta com aproximadamente 334 quilômetros), notei diversas outras iniciativas pró-bicicleta espalhadas pela cidade, como paraciclos e bicicletários instalados em muitos estabelecimentos comerciais. De uma maneira geral, acredito que as redes cicloviárias existentes nas diversas cidades brasileiras só atingirão densidade e qualidade significativas quando a bicicleta for considerada de fato um modal de transporte, sendo incorporada de maneira integral ao planejamento da mobilidade urbana destas cidades. Hoje, a falta de diálogo entre os diversos órgãos públicos responsáveis pela implementação desta infraestrutura e a descontinuidade dos estudos e planos existentes, por conta de mudanças de gestão, são questões que influenciam de maneira negativa o desenvolvimento dessas redes.

IAB: O que podemos aprender com as experiências de Amsterdã no uso da bicicleta?

A experiência de Amsterdã nos mostra que a extensa infraestrutura cicloviária existente no país é fruto de um longo processo de amadurecimento da sociedade holandesa e que, como todo projeto urbano de grande porte, levou anos para chegar ao nível de complexidade que vemos hoje. Além disso, há que se ressaltar o caráter integrado e inovador do planejamento urbano holandês, que considera os mais diversos fatores na execução dos seus projetos de infraestrutura, revisando e readaptando constantemente seus conceitos, num processo de tentativa e erro. A questão dos bicicletários é um exemplo desta dinâmica. Se antes as bicicletas estacionadas em espaços públicos eram vistas como elementos essenciais na humanização destes locais, hoje elas são um grande problema por terem se multiplicado de maneira descontrolada, ocupando áreas de circulação e de estar dos pedestres. Como parte da solução, diversos bicicletários subterrâneos  estão sendo construídos neste momento, principalmente próximos aos grandes modais de transporte público. Outra questão que está sendo repensada diz respeito ao redimensionamento das ciclovias existentes. Na impossibilidade de se alargar algumas ruas de grandes cidades como Amsterdã, a hierarquização viária destas ruas está sendo revisada e seus perfil, redesenhado. Hoje, já existem ruas onde o ciclista tem prioridade, e o carro é tratado como um mero "convidado", são as chamadas fietsstraten (ruas de bicicletas).

Na galeria de imagens, as fotos enviadas pela Isabela Ledo, mostram o bicicletário nos fundos da Estação Central de Amsterdã, a ciclovia Rijksmuseum, o bicicletário que fica na frente da Estação Central, também em Amsterdã, e ciclovia na orla de Boa Viagem, em Niterói.     

Fonte:http://iab.org.br/noticias                

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